No presente, uma palavra tem sido reverberada pela mídia, dominando painéis dos mais variados segmentos, de feiras empresariais à educação executiva, para alguns à exaustão: Compliance.
Restando superado, portanto, o significado da palavra ou a conceituação técnica do que ela representa, na prática, nas centenas de reuniões das quais participamos como consultor especialista, uma pergunta não falta, advinda do executivo ou alta administração: Como o Compliance agrega (ou agregará) valor à minha operação?
A resposta é sempre direta: O Compliance só agregará valor à sua operação, se estiver alinhado à estratégia traçada para o seu negócio.
Apesar de singela, colocar em prática a máxima refletida na resposta não é peça de um ato. Para um Compliance eficaz, efetivo e que agregue valor e resultados positivos, é imprescindível que, além de seguir diretrizes técnicas acertadas no desenvolver dos trabalhos, a organização tenha objetivos estratégicos claros e pré-estabelecidos (quando não pré-estabelecidos, alinhados, no máximo, concomitantemente à implantação do Compliance), identificando não somente os resultados que deseja alcançar, mas também os processos e as áreas críticas do negócio, que poderão influir direta e/ou indiretamente no alcance das metas e objetivos traçados.
Através da identificação dos objetivos estratégicos, dos processos e das áreas críticas do negócio, delimita-se o escopo prioritário de trabalho, a partir do qual o Compliance pautará suas ações, sejam elas relacionadas à implantação ou manutenção do programa.
Iniciando-se os trabalhos com olhos voltados às áreas críticas, o Compliance trabalhará de forma conjunta e estruturada com os líderes de cada qual para, mediante a análise dos processos, mapear os riscos e identificar, além daqueles relacionados aos próprios processos, como eles se relacionam com o atingimento dos objetivos estratégicos, estabelecendo, ainda, um plano de monitoramento e tratamento contínuo dos riscos.
Recentemente, em uma reunião com executivo de cooperativa do segmento da saúde, ele nos fez a pergunta retratada nos parágrafos anteriores. Ao invés de respondê-lo imediatamente, perguntei quais seriam os objetivos estratégicos da organização e quais seriam os processos, áreas críticas e mais sensíveis da sua operação.
A partir dai, ele passou a narrar detalhada e apreensivamente diversos pontos críticos da operação, como o relacionamento com órgãos reguladores e as elevadas multas às quais eles estavam tão facilmente expostos, aspectos relacionados à gestão da qualidade dos serviços e produtos ofertados, suas dificuldades em propagar de forma clara e estruturada mensagens da alta administração, tendo em vista os mais de 27 escritórios de negócio distribuídos pelo país, suas preocupações relacionadas à exposição da sua marca, os riscos latentes relacionados à gestão de pessoas e a forma de contratação de seu time de vendas, dentre tantas outras situações.
Sem perceber (e procurei deixar isso claro posteriormente), ele pontuou os principais pontos que o Programa de Compliance poderia tratar naquela cooperativa e com base na fala dele é que construímos uma proposta de trabalho assertiva do projeto que teríamos doravante. Sem dúvida, a implantação de um Programa de Compliance agregaria muito valor à sua operação.
Exemplificando, somente no que tange ao relacionamento com órgãos reguladores, qualquer redução de multas aplicadas, mediante o aprimoramento de processos, controles e gestão de riscos, poderia significar a economia de centenas de milhares de reais.
Ninguém conhece o negócio como aquele que está em campo, como aquele que vivencia diariamente os desafios da organização, razão pela qual, o Programa de Compliance, em uma visão técnica, mas extremamente pragmática, só faz sentido ao auxiliar na resolução concreta dos gargalos do dia a dia.
No caso prático acima, propusemos a construção de um trabalho focado inicialmente nas áreas de comunicação interna, marketing, recursos humanos, relacionamento com agências reguladoras e comercial, analisando e desenvolvendo para cada qual regras e instrumentos, políticas e procedimentos, dentre outras recomendações, visando revisitar não somente os processos de cada área, mas também criar insumos para uma mudança de cultura, de gestão integrada dos riscos da organização.
É claro que, a depender do segmento de atuação da cooperativa ou da empresa, os objetivos estratégicos, os processos e as áreas críticas do negócio serão distintas do caso retratado (podendo recair sobre aspectos ambientais, tributários, trabalhistas, logísticos, relacionados ao comércio exterior, de qualidade, relacionamento com clientes e fornecedores, dentre tantos outros, etc.), mas o importante é a assertividade do trabalho a ser desenvolvido.
Buscar a conformidade sem foco em prioridades torna o projeto desorganizado, caro e muitas vezes, interminável. Não há cooperativa ou empresa 100 % em conformidade. Deve-se, portanto, empenhar esforços concentrados, para a conformidade em processos e áreas chave, voltados ao alcance dos objetivos estratégicos.
Recentemente, a justiça condenou o Hospital Sírio Libanês a pagar R$ 577 mil para uma médica que, supostamente, teria divulgado detalhes sobre o diagnóstico do estado de saúde da ex-primeira-dama Marisa Letícia. Um Programa de Compliance competente teria evitado essa condenação, porquanto direcionaria para uma investigação profunda e isenta, com o correto mapeamento dos riscos envolvidos e, possivelmente, indicando os verdadeiros culpados pelo vazamento, preservando pessoas que não necessariamente contribuíram para o fato.
Por certo que se pode avaliar que a demissão (mesmo diante da condenação) tenha sido mais alinhada aos objetivos estratégicos do Hospital (ao se cogitar eventual dano reputacional mantendo a médica em seus quadros), mas para ingressar nessa análise, teríamos de construir ou consultar a matriz de riscos que detalhou a situação.
Pelo sim, pelo não, é flagrante a possibilidade de se agregar valor a qualquer operação, mediante o bom uso do Programa de Compliance.
Felipe Bezerra da Silva – Eticca Compliance